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Ação de Vanderlan pode tirar Gayer da disputa em Goiânia e gerar aliança PSD-PL com Vitor Hugo na vice

Senador abriu procedimento contra deputado federal em processo por calúnia e fake News que está nas mãos da PF e do STF

Por Marcus Vinícius de Faria Felipe, do Onze de Maio

O chamado campo conservador está em polvorosa em Goiânia. O senador Vanderlan Cardoso (PSD), que já disputou duas vezes as eleições para prefeitura de Goiânia abriu procedimento contra o deputado federal Gustavo Gayer (PL) no Supremo Tribunal Federal, que foi acatado pelo ministro Alexandre de Morais.

Trata-se da notícia-crime nº 10.972,  assinada pelo advogado Pedro Paulo de Medeiros, onde o senador Vanderlan Cardoso acusa o deputado federal Gustavo Gayer de “crimes contra a honra (injúria, calúnia, difamação, com várias causas especiais de aumento de pena) do ora requerente, Senador VANDERLAN CARDOSO, bem como dos Senadores DAVI ALCOLUMBRE, RODRIGO PACHECO, JORGE KAJURU e também em face de Ministros do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL e de outros Senadores da República”, descreve a peça.

No texto da notícia-crime o requerente (Vanderlan Cardoso), argumenta que a imunidade parlamentar de Gayer não dá ao deputado o direito de caluniar os senadores supra citados:

“Liberdade de expressão não é Liberdade de agressão!

Liberdade de expressão não é Liberdade de destruição da Democracia, das Instituições e da dignidade e honra alheias! Liberdade de expressão não é Liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos!”, diz o texto.

A ação pede “EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO à empresa META INC. para que, no prazo de 2 (duas) horas, sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 proceda à integral preservação e envio aos autos” e a retirada da rede dos links no Instagram https://www.instagram.com/p/CoIrDWEDP7q/ e https://www.instagram.com/p/Cn2IIsBD3Cn/ onde o parlamentar ofende a honra dos senadores. O conteúdo, no entanto, ainda está nas redes.

No seu despacho o ministro Alexandre de Morais remeteu os autos à PF, para perícia dos links e para a Procuradoria Geral da República (PGR) para ciência da ação.

Nas eleições de 2022, o senador Vanderlan Cardoso (PSD) apoiou a candidatura do Major Vitor Hugo (PL) para o governo do Estado e o empresário Wilder Morais (PL) para o Senado. Com o episódio envolvendo Gayer, crescem as chances de uma aliança entre Vanderlan Cardoso e Vitor Hugo, com o bolsonarista compondo a vice. Seria a retribuição ao apoio no pleito anterior, formando uma chapa forte entre a direita e a extrema-direita nas eleições municipais, considerando que Vitor Hugo teve 117.222 em Goiânia.

 

Fonte: Jornal Onze de Maio e DM

https://digital.dm.com.br/#!/view?e=20230622&p=8

 

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Pragmatismo Político faz especial 25 anos das eleições de 1989

Há 25 anos, o país voltava a escolher seu presidente e a política estava na rua. Eleição de 1989, conquistada quase seis anos depois das Diretas Já, e marcada por golpes baixos, encaminhou consolidação democrática em meio ao fim da Guerra Fria. Marqueteiros tinham menos presença

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Eleições de 1989: Há 25 anos, o Brasil voltava a escolher seu presidente e a política estava na rua (Pragmatismo Político)

Especial. Vitor Nuzzi. Rede Brasil Atual.

Hilton Acioli vai lembrando e cantarola, “rompe a cortina do passado”, “vai lá e vê que a alegria já demorou demais”. O compositor havia recebido “duas palavrinhas” do publicitário Paulo de Tarso Santos e teve a responsabilidade de fazer um jingle. Vê o que dá para fazer, disseram a ele. “Na hora, eu não achei nada”, lembra o compositor potiguar, que completará 65 anos em outubro, na véspera da eleição, e foi componente do Trio Marayá, nos anos 1950 e 1960. “A sorte é que ficou na minha memória.” Para buscar a canção, ele conta que havia a preocupação de aproximar o “tema” do jingle ao que Hilton chama de elite popular, citando Noel Rosa, Ary Barroso, Pixinguinha: “Populares, mas ao mesmo tempo clássicos.”

De Ary veio um mote: “Abre a cortina do passado”, canta de novo. E foi assim que ele compôs um samba, no início de 1989, para apresentar aos “clientes”, no comitê de campanha, na Vila Mariana, zona sul de São Paulo. Estavam lá Ricardo Kotscho, Aloizio Mercadante, Vladimir Pomar, entre outros. O “tema” viria de Brasília para escutar, mas não foi. E Hilton cantou o samba: “Eu olhava na cara deles e pensava: a música não é esta”. De lá, saiu para papear com um amigo, o publicitário Osvaldo de Melo, a quem repetiu: acho que não é essa música. E foi para casa. “Quando acordei, me veio a música.”

E ele cantarola mais uma vez um dos jingles políticos mais marcantes de todos os tempos. “Quando você faz uma música nova, que você acredita, fica todo energizado”, diz Hilton, lembrando das origens do Lula lá, feito para a primeira campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, em 1989. A letra da música faz referência ao “primeiro voto”. A ideia era falar tanto dos jovens como de quem, de fato, iria pela primeira vez à urna para escolher o presidente.

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O grito das Diretas Já ganhou as ruas do país entre 1983 e 1984. O direto de eleger o presidente viria em 1989 | Foto: Fernando Santos/Folhapress (25/1/1984)

Era a primeira eleição presidencial desde 1960. Nos momentos finais da ditadura, o Brasil voltara a escolher governadores pelo voto direto (1982) e prefeitos de capitais e parte dos municípios (1985). Passara por uma campanha nacional de restabelecimento das eleições presidenciais, o movimento das Diretas Já, em 1984, direito só reconquistado em 1989, quando foram às urnas 70 milhões de pessoas, menos da metade do eleitorado atual. Para o cientista político Paulo d’Avila Filho, a eleição de 1989 “simboliza a retomada da democracia”. Este ano, o Brasil vai para a sétima eleição presidencial seguida, uma sequência inédita no país.

Candidatos: 22

Essa retomada, de certa forma, pode ser medida pela quantidade de candidatos a presidente: 22, número que nunca mais se repetiu. Este ano, por exemplo, são 11. Se hoje há três candidatas, duas disputando o primeiro lugar, em 1989 apareceu a primeira mulher na disputa presidencial: a advogada mineira Lívia Abreu, do Partido Nacionalista (PN), que recebeu 180 mil votos, 0,25% do eleitorado. Ali apareceu pela primeira vez Enéas Carneiro, do nanico Prona (360 mil votos, 0,5%). Lanterna do primeiro turno (4 mil votos, 0,01%), Armando Corrêa, o “candidato dos explorados”, chegou a renunciar em favor do apresentador Silvio Santos, que apareceu 15 dias antes do primeiro turno, mas foi barrado pela Justiça Eleitoral.

Na política brasileira, depois da frustrada campanha das diretas, a maior parte da oposição, ao lado de ex-integrantes do governo, partiu para o voto indireto no colégio eleitoral. O governador de Minas Gerais, Tancredo Neves (PMDB), superou Paulo Maluf (PDS, partido que sucedeu a Arena, que sustentava a ditadura), e foi eleito presidente, com apoio de alguns remanescentes do antigo regime, reunidos sob o título de Nova República, que duraria pouco.

Tancredo não chegou a assumir. Foi internado na véspera da posse, em 15 de março de 1985, e morreu pouco mais de um mês depois, em 21 de abril. Sarney assumiu e, no final de governo, estava praticamente isolado. Mesmo com a esperança democrática, as tensões continuavam e os planos econômicos não davam conta de superar as altas constantes do custo de vida.

Eram tempos de inflação nas nuvens. Quase 40% ao mês, incríveis 758,79% acumulados naquele ano, até outubro (IPC) e 1.303,78% em 12 meses. Havia o dólar no mercado paralelo, ou “black”, com ágio de 100% em relação ao oficial.

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O país vinha da eleição de Tancredo Neves pela via indireta, com uma morte que levou José Sarney ao poder | Foto: Célio Azevedo/Fotos Públicas

Na política, conservadores ainda assombravam a população com fantasmas, como o comunismo. Foi em 1989 que caiu o Muro de Berlim, que separava as Alemanhas (divididas em Ocidental, capitalista, e Oriental, comunista), em representação real e dramática da divisão ideológica mundial. Em 1991, a União Soviética, o outro lado da “Guerra Fria” com os Estados Unidos, deixaria de desistir. A eleição de 1989, para o conservadorismo, ainda acenava com a ameaça esquerdista “Brizula”, junção dos nomes de Brizola e Lula.

Assessor de imprensa de Lula, o jornalista Ricardo Kotscho lembra que a inserção de alguns desses fantasmas dificultou até o simples aluguel de uma casa para sediar o comitê. Um empresário amigo dele chegou a dizer que não poderia alugar um imóvel, porque com uma vitória de Lula a sua propriedade seria tomada. “Era muito difícil. O que animava era a militância. Era tudo muito improvisado. Muitos comícios… Estou cansado até hoje. E também era uma grande festa, que, para mim, pareceu uma continuação da campanha das diretas. A gente sabia que estava participando de um momento histórico.”

Palanque

Do esquema quase mambembe no primeiro turno, a estrutura melhorou um pouco no segundo, quando Lula, pelo PT, enfrentou Fernando Collor, do PRN. Até apareceu um jatinho, coisa que sobrava na campanha adversária. Subiram no palanque do petista os candidatos do PDT, Leonel Brizola, e do jovem PSDB (criado um ano antes), Mário Covas, quarto colocado no primeiro turno, com 7,8 milhões de votos. Só não estava “o doutor Ulysses”, o candidato do PMDB, Ulysses Guimarães, porque Lula não quis – e Kotscho observa que, tempos depois, o candidato do PT reconheceria ter cometido um erro político. Isso não impediu que a campanha tomasse corpo, a ponto de ninguém cravar o resultado.

Na primeira votação, em 15 de novembro, Collor teve 22,6 milhões de votos (28,52%) e Lula, 11,6 milhões (16%), em disputa acirrada com Brizola, a quem superou por apenas 500 mil votos. Na véspera do segundo turno, que seria em 17 de dezembro, as pesquisas apontavam situação de empate técnico, com tendência de ascensão do petista. Do dia 7 ao 17, segundo o instituto Datafolha, Collor foi de 50% para 47% e Lula, de 41% para 44% Parecia estar se confirmando um vaticínio do veterano Brizola, autor da expressão “sapo barbudo” para se referir a Lula, no sentido de um batráquio que seria imposto à conservadora elite brasileira.

Cada um do seu jeito, Lula e Collor representavam o “novo” naquela eleição, observa o especialista Chico Santa Rita, um dos precursores do marketing político no Brasil. Vindo da campanha de Orestes Quércia (PMDB) a governador em 1986, ele havia trabalhado com Ulysses no primeiro turno (3,2 milhões de votos) e fora convocado pelo staff de Collor, àquela altura preocupado com a possibilidade de derrota. A primeira providência foi fazer uma pesquisa qualitativa, ainda pouco comum. “O quadro era que as pessoas estavam cansadas da ditadura e do governo Sarney, que tinha uma avaliação péssima. Elas queriam o novo. Uma sensação semelhante ao que há hoje. Foram (para o segundo turno) os candidatos mais novos, um líder sindical combativo e um governador jovem, com uma proposta de acabar com os escândalos, os marajás.”

Ele assumiu quase em momento de emergência, com a equipe anterior demitida. “O que eu diagnostiquei? Tinha um discurso (no primeiro turno) muito forte na moralização da administração pública. Não sei se estavam cansados… O programa foi ficando fraco, com mais brincadeirinha, pessoas ficavam coloridas. O que eu fiz foi retomar o discurso político com muita força.”

Fantasia

Chico Santa Rita acredita que há deformações e falta de entendimento em relação ao trabalho do marketing político. “O pessoal acha que é propaganda. É uma atividade multifacetada, que inclui elementos da propaganda, do jornalismo, da pesquisa, de relações públicas. Tem uma complexidade. Não é feito para criar o candidato, mas para para melhorar o desempenho do candidato. Todas as vezes que eu vi fazerem isso, não deu certo.” Ele também critica programas atuais, citando tanto PT como PSDB. “Usam e abusam de uma distorção da verdade, mostrando um país que parece de fantasia. Está havendo exagero. O marketing político foi feito para dinamizar a discussão política.”

Surgido com pinta de bom moço, Collor acabou vitorioso após um segundo turno marcado por acusações e atritos (Foto: Chico Ferreira/Folhapress)
Surgido com pinta de bom moço, Collor acabou vitorioso após um segundo turno marcado por acusações e atritos (Foto: Chico Ferreira/Folhapress)

Em seu livro Batalhas Eleitorais, Chico relata episódios que, de certa forma, mostram que a campanha teve momentos que estiveram bem longe do debate político. A uma semana da votação, ele recebeu das mãos de Collor um vídeo com imagens de um fuzilamento de três prisioneiros – Lula aparecia olhando e até sorrindo, ao final. Sem acreditar, reviu e depois chamou o engenheiro que prestava assistência técnica. A resposta foi clara: “Trata-se de uma montagem. A imagem de Lula foi superposta na imagem básica do fuzilamento”. O vídeo não foi ao ar.

Além disso, havia a constante menção ao “comunismo” como ameaça e um suposto “derramamento de sangue”, como chegou a dizer Collor, que o PT promoveria para chegar ao poder. “O Lula nunca deixou responder no mesmo nível. Ele nunca aceitou o vale-tudo”, diz Kotscho. Para ele, o uso do marketing político surgiu com Collor, que contava com grande estrutura de campanha. “No nosso caso, era um grande mutirão. Tinha muitos voluntários. E todo mundo dava palpite. Era mais amador, mais coletivo.”

Kotscho viajava com Lula, escrevia o texto com o dia do candidato e, por telefone ou telex – não existia internet – mandava o material para o também jornalista Sérgio Canova, que repassava para as redações. Para ganhar tempo, marcava entrevistas coletivas nos aeroportos. Em uma dessas paradas, em Maceió, estranhou não ver ninguém para entrevistar o líder petista. “Aqui tudo é do homem”, foi a explicação que recebeu do coordenador local. O “homem” era Collor, dono de grande parte dos meios de comunicação de Alagoas.

O final da história é conhecido. Com 35 milhões de votos (53% dos válidos), Collor foi eleito. Lula recebeu 31 milhões (47%). Em 1992, o presidente sofreu impeachment e o vice, Itamar Franco, assumiu.

Após primeiro turno apertado, Lula recebeu apoio de candidatos de esquerda e esteve próximo de vencer Collor (Foto: Niels Andreas/Folhapress)
Após primeiro turno apertado, Lula recebeu apoio de candidatos de esquerda e esteve próximo de vencer Collor (Foto: Niels Andreas/Folhapress)

“Marqueteiro” de Lula em 1989, o publicitário Paulo de Tarso Santos considera “paradigmática” aquela eleição. Lembra que, em 1982, ainda estava em vigor a Lei Falcão (Lei 6.339, de 1976, que ganhou o nome do então ministro da Justiça, Armando Falcão). Na prática, o texto proibia qualquer campanha eleitoral. Só era permitido divulgar legenda, currículo e número do candidato – na TV, também a foto. Ninguém podia falar, algo no estilo “nada a declarar”, frase que se tornou associada ao ministro da Justiça do governo Geisel (1974-1979). A lei foi revogada em 1984. A campanha de 1985, para a prefeitura de São Paulo, já trouxe a experiência do slogan ‘Experimente Suplicy”, “já tentando um uso criativo do programa eleitoral.”

‘Radicalizar a esquerda’

Em 1989, o objetivo era “radicalizar a esquerda”, conta Paulo de Tarso. “O início do raciocínio – eu, Carlos Azevedo e Zé Américo – foi muito simples. Tínhamos 22 candidatos, e de 25% a 30% do eleitorado se dizia de esquerda. Queríamos falar direto com o pensamento progressista. Tinha várias peças de jornalismo mostrando a desigualdade no Brasil. Era uma campanha bem política, com menos propaganda.” Porém a campanha precisava de uma “embalagem”. Em uma reunião em sua casa, surgiu a ideia da Rede Povo, programa que marcou a campanha – e qualquer semelhança com uma emissora de televisão não é coincidência. “Eu até brincava: se é para pegar o inimigo, vamos pegar o inimigo de verdade.”

Para a campanha no segundo turno, Paulo de Tarso diz que havia a ideia de construir um “Lulinha paz e amor”, como se falaria em 2002, quando o petista enfim chegou à Presidência da República. “Mas não deu tempo. Começaram contra nós uma campanha anticomunista”, afirma o publicitário, para quem a campanha na TV foi vitoriosa.

Ele também faz ressalva ao trabalho do marketing político. “O Lula falava de improviso. A gente passava o tema do programa, ele estudava e traduzia, e a gente ia aprimorando juntos no estúdio, sugerindo coisas que ele encaixava ou não. A gente sempre privilegiou a autenticidade dele. Não tinha todo esse arsenal de monitoramento que tem hoje.” Para Paulo de Tarso, o que deve prevalecer é a intuição do político. “As pesquisas são um instrumento para você ter uma medida da opinião pública, para você não bater o prego com os dedos.”

A paternidade da expressão “Lula lá” ainda causa alguma polêmica. Alguns a atribuem ao publicitário Carlito Maia, outros, inclusive ele próprio, a Paulo de Tarso, que passou a encomenda do jingle a Hilton Acioli. Ele conta que, além de não gostar de trocadilho, achava o tema fraco, preferindo algo mais no estilo “povo no poder”. “A gente não tinha a menor noção. Tinha certeza de que a gente ia levar o maior cacete. Foi um fato político gigantesco.”

Para Paulo d’Avila, o que mudou em relação a 1989, basicamente, foi o perfil do eleitorado, à medida que as eleições foram se tornando rotineiras. “O que a literatura mostra é que o eleitorado vai se comportando mais para uma curva normal, o que leva os competidores a uma posição mais conservadora”, analisa. Naquele ano, acrescenta o cientista político, havia “grande massa com expectativas mais à esquerda e mais à direita”, o que permitia maior polarização.

De um lado havia Brizola, Roberto Freire (PCB), Lula e, de certa forma, até Covas disputando um naco de centro-esquerda. “O eleitorado desejava o novo. Quem se destaca naquela eleição? O discurso mais à esquerda, Lula/Brizola”, diz o professor.

Na outro lado, candidatos como Guilherme Afif e Collor. “Havia um eleitorado disposto a consumir as expectativas mais polarizadas. Quanto mais você consolida o procedimento (eleição), mais o eleitorado vai se acomodando. Você passa a disputar o centro.” Ele identifica um processo de “mediocrização” do processo político – “No sentido exato do termo, do médio.”

D’Avila também destaca a relevância que o marketing político ganha naquele eleição. “Nós nos redemocratizávamos numa sociedade da comunicação, principalmente com a televisão. O Collor foi incrivelmente fiel à persona que criaram para ele.”

Romantismo

A uma indagação se havia mais espontaneidade naquela campanha, o cientista político acredita que existe certo “romantismo” em relação a isso. “Espontaneísmo serve para disputar posições”, diz d’Avila. Falando sobre as campanhas atuais, ele acredita não ser possível a um candidato em condições de vencer dizer o que pensa, mas o que é necessário ser dito. “Não significa mentir, mas ajustar o discurso”. O eleitor vai se identificando com os candidatos e há o processo de acomodação. “Aquele espectro de 1989 não desapareceu, vai sendo incorporado a coalizões de governo.”

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Debate entre Collor e Lula no SBT; na época, edições eram permitidas. ‘Jornal Nacional’ abusaria do recurso | Foto: Vidal Cavalcante/Folhapress (dez/1989)

As mudanças podem ser constatadas também nos debates televisivos. Em 1989, os embates eram frequentes e, por vezes, ríspidos. Ficou célebre, por exemplo, um bate-boca entre Brizola, o “desequilibrado”, e Maluf, o “filhote da ditadura”. Para Paulo d’Avila, as regras atuais engessaram o debate em um cenário “duplamente engessado”, em relação aos temas. “Em 1989, saindo de uma ditadura, os candidatos falavam mais de Estado. Hoje, seria impensável… Lembro de uma discussão entre Lula e Roberto Freire sobre a relação de seus partidos com a OIT (Organização Internacional do Trabalho). O formato (do debate) acho que nem é o principal problema. Antes, tinha pouca regra porque não havia debate.”

E há também a “qualidade dos quadros”. Kotscho concorda com esse último item: “Os personagens políticos eram diferentes. Empobreceu muito o debate, não é só questão de regra”. Além de identificar queda na audiência da TV, o jornalista vê pessoas se xingando nas redes sociais e falta de grandes comícios. “Enquanto não houver reforma política, não vai mudar nada.”

Eles também coincidem, em certa medida, na análise sobre o comportamento da mídia. “Varia de uma eleição para outra. Foi muito difícil em 1989. Nunca vi algo tão escrachado como agora”, diz Kotscho. “Não disfarçam mais. Não estão tendo pudor.” Assim, segundo ele, depois de abraçar inicialmente a candidatura de Aécio Neves (PSDB), os principais meios de comunicação passaram a fazer campanha aberta para Marina Silva (PSB). E, obviamente, passa pelo rol de polêmicas daquele ano a edição, pelo Jornal Nacional, do debate no segundo turno. No livro Do Golpe ao Planalto, Kotscho resume desta maneira: “Editaram só os melhores momentos de Collor e os piores de Lula. O resultado do jogo, que tinha sido 2 x1 na edição do Hoje (telejornal vespertino), transformou-se magicamente em 10 x 0”.

Imparcialidade?

“Em 89, ainda que se possa dizer que havia uma preferência eleitoral, ainda havia uma enorme preocupação de dizer que não. Hoje, acho que são muito mais explícitas as posições dos meios de comunicação em relação a suas preferências”, comenta Paulo d’Avila. “Hoje caminha (o jornalismo) para um tipo de cobertura que explicita cada vez mais a sua preferência.” Para ele, “a fantasia da imparcialidade habita os bancos escolares do Jornalismo e do Direito”. Ele costuma dizer aos alunos que, quem quiser, sabe onde é possível encontrar notícias pró e contra o governo, mas acredita que a situação melhoraria em um ambiente de maior competitividade nos meios de comunicação.

Ainda sob o efeito do ato de artistas a favor de Dilma, no dia 15, no Rio de Janeiro, o ator Sérgio Mamberti destaca o discurso de Lula sobre o “marco civil” da mídia e acrescenta: “Eu falo isso desde 89”. Para ele, a mídia constitui hoje um campo de dominação e deixa o consumidor de notícia “praticamente subordinado ao interesse dessas grandes corporações”.

Naquela campanha, marcada por intensa participação do mundo artístico, política e cultura estavam no mesmo campo, avalia Mamberti. “A política é uma dimensão da cultura”, diz o ator, estendendo o raciocínio à questão da educação, que, para ele, não pode ser isolada, sob risco de cair na tecnocracia. “O centro do governo tem de entender que a dimensão da cultura oferece uma oportunidade de reflexão. As transformações se dão no campo da cultura, no campo das ideias.”

Ele lamenta que tenha havido, no Brasil, uma desqualificação do processo político, especialmente após o episódio conhecido como mensalão. “Não que não foram cometidos erros, mas o processo (a ação) foi tendencioso. A sociedade ainda vai ter de se apropriar da verdade. A reforma política passa a ser um tema absolutamente contemporâneo”, diz Mamberti.

O ator também faz ressalvas ao tratamento que é dado hoje aos candidatos, por meio do marketing político. “Eu diria que o marqueteiro tem uma hegemonia que distancia o candidato de uma discussão política mais profunda. Acho que a gente tinha de ter um aperfeiçoamento técnico do ponto de vista da comunicação, mas, de repente, houve uma inversão de papéis, a embalagem se colocou acima da política.”

Também desse ponto de vista, 1989 foi emblemático. “Embora houvesse os marqueteiros, nós todos participávamos, dávamos contribuições. A gente podia fazer sugestões, que eram aceitas. Hoje, não existe mais esse espaço criativo de um Henfil e de um Carlito Maia. Essa dimensão cultural se expressava plenamente em todas as formas que a gente foi construindo de uma visão coletiva.”

Para Mamberti, 1989 representou o momento final de saída do regime autoritário. “A gente tinha certeza de que ia começar um novo momento na história do Brasil.” Ele espera que haja continuidade nessa direção. “A participação social seria a forma de legitimar a construção de políticas públicas. Para aprofundar e radicalizar esse processo democrático, não basta que as pessoas tenham ascensão econômica”, observa o ator.

Hilton Acioli destaca a “efervescência” daquele momento político. “Desde 1984, na campanha das diretas, já tinha muita gente envolvida.” E é por isso que as músicas permanecem, acredita o compositor. “Ficou com o cheiro daquele tempo.”

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Metrópolis: 35 anos da 1ª eleição de presidente

  • Metrópoles:

Relembre o que diziam as pesquisas a 6 meses das eleições presidenciais desde 1989

 

Candidato que liderava as pesquisas a seis meses da votação venceu a disputa em quatro das oito eleições presidenciais. As mudanças significativas ocorreram em 1989, 1994, 2010 e 2018

Relembre diziam pesquisas meses eleições presidenciais desde 1989
Debate Presidencial 1989 – 2º turno: Lula X Collor

Flávia Said, Metrópoles

Pesquisas do Instituto Datafolha sobre eleições presidenciais realizadas desde 1989, quando ocorreu o primeiro pleito direto depois da redemocratização, mostram que o candidato que liderava as enquetes a seis meses da votação venceu a disputa em quatro das oito eleições. Houve mudança significativa no cenário entre abril e outubro nos anos de 1989, 1994, 2010 e 2018.

O Instituto Datafolha foi selecionado para a análise, porque é o único que presta o serviço da mesma forma desde a volta da democracia ao país, e com constância e regularidade na divulgação de pesquisas eleitorais. As informações são do portal Metrópoles.

O levantamento baseou-se nos acervos do instituto e em notícias veiculadas pela imprensa. Foram consideradas perguntas estimuladas com o principal cenário apresentado ao eleitor. Para as apurações finais das eleições, foram consultados os dados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desde 1994, as eleições são realizadas no Brasil no mês de outubro.

Portanto, foram observadas as pesquisas de abril realizadas em 2018, 2014, 2010, 2006, 2002, 1998, 1994 e 1989. O pleito que elegeu Fernando Collor (então no PRN) ocorreu entre novembro (primeiro turno) e dezembro (segundo turno) de 1989, mas, como não há registro de levantamento em maio, também foi considerada a pesquisa realizada no fim de abril daquele ano.

Na primeira eleição direta pós-redemocratização, Collor, Lula (PT) e Leonel Brizola (PDT) estavam tecnicamente empatados, com 14%, 13% e 12% das intenções, respectivamente. Collor cresceu a partir de junho, mas, ainda assim, o confronto foi para uma segunda votação, com Collor e Lula disputando a preferência do eleitorado.

↗ Especial: 25 anos das eleições de 1989

Veja: Após 22 anos, Boni admite que Globo armou contra Lula para eleger Collor

Collor, FHC e Temer: os três tempos do neoliberalismo brasileiro

↗ Lula foi o melhor presidente da história, diz pesquisa Datafolha

↗ Veja na íntegra a 1ª entrevista de Dilma Rousseff, a primeira mulher eleita presidente do Brasil

Leia também:
A eleita e a ressaca pós eleição da ala oposicionista
Previsões de Dilma viram realidade após o impeachment

Em 1994, Lula apresentava 42% das intenções de voto, segundo o Datafolha, ante 16% de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). FHC, porém, conseguiu virar o jogo e vencer ainda em primeiro turno, com 54,24% dos votos válidos, embalado pelo Plano Real.

Em 2010, a sucessora de Lula, Dilma Rousseff (PT), contabilizava 28% das intenções de voto em um primeiro momento, 10 pontos percentuais atrás do principal adversário, o tucano José Serra, com 38%. Ela acabou eleita em segundo turno, por 56,05% a 43,95%.

Em 2018, pesquisas aplicadas por diferentes institutos acertaram, ao mostrarem a tendência de alta do candidato Jair Bolsonaro, então no PSL, apesar de nem todas terem acertado sua vitória em segundo turno. O mandatário frequentemente ataca os levantamentos para questionar dados que apontam aumento na sua rejeição.

Bolsonaro registrava, no último levantamento do Datafolha antes do primeiro turno, 35% das intenções de voto, ante 22% de Fernando Haddad (PT) . Nas urnas, Bolsonaro obteve 46,03% dos votos válidos e Haddad, 29,28%.

2022

A mais recente pesquisa divulgada pelo Datafolha para as eleições presidenciais de 2022 mostra o ex-presidente Lula na dianteira, com 43% das intenções de voto, seguido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), com 26%, e pelo ex-juiz Sergio Moro (então no Podemos), com 8%. O levantamento consultou 2.556 pessoas nos dias 22 e 23 de março. Ainda não foi divulgada pesquisa no mês de abril.

Segundo o próprio instituto, a pesquisa de março não é diretamente comparável à anterior, feita de 13 a 16 de dezembro, por aplicar cenários distintos — basicamente, retirando nomes que saíram da disputa, como os do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) e do ex-ministro Aldo Rebelo (sem partido), e incluindo outros nomes: de Vera Lúcia (PSTU), André Janones (Avante) e Leonardo Péricles (UP).

Na rodada anterior, Lula oscilava de 47% a 48%, e Bolsonaro, de 21% a 22%. Os números comparáveis com dezembro mostram uma leve melhoria do cenário para o atual presidente.

Em abril de 2018, Lula também liderava as pesquisas, mesmo ainda estando preso em Curitiba (PR), após condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá – sentença atualmente anulada. Ainda não tinha saído a decisão judicial oficial que o tiraria da eleição.

Seis meses antes do pleito de quatro anos atrás, o petista aparecia com 31% das intenções de voto, contra 15% de Bolsonaro. Desde então, já se apontava que o PT e Bolsonaro deveriam ser os protagonistas da eleição, visto que o terceiro colocado, Geraldo Alckmin (PSDB), apresentava menos de 10% das citações.

“Fotografia do momento” e tendências

Especialistas alertam que as pesquisas eleitorais registram uma “fotografia do momento” e devem ser analisadas em contexto mais amplo, ao apontarem tendências.

Max Stabile, diretor do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD), faz uma analogia entre as pesquisas eleitorais e os placares de partidas de futebol.

As enquetes eleitorais são um placar do jogo aos 45 minutos do segundo tempo. No caso dos seis meses, é o placar do jogo no primeiro tempo, nos primeiros 15 minutos”, explica Stabile. “Aos 45 minutos do segundo tempo, muitos placares mudaram”, continua ele, explicando que, por mais que um lado tenha jogado melhor, pode haver uma mudança derradeira no resultado.

Essas pesquisas medem o retrato daquele momento. Num jogo político, está todo mundo trabalhando para que ele mude”, prossegue, detalhando que as pesquisas encomendadas pelos candidatos miram justamente em mudanças de cenários.

Prorrogação

Em outra analogia futebolística, Stabile ressalta que as pesquisas não captam a prorrogação do jogo, porque a própria regra eleitoral exige um intervalo entre a divulgação do levantamento e a data em que os eleitores depositam seus votos nas urnas. “As pessoas podem mudar de opinião na véspera”, explica o especialista.

A literatura aponta que as pesquisas podem ter um resultado diferente da última divulgação, principalmente em municípios menores, em localidades em que haja uma alta competição entre os candidatos e onde exista um número grande de indecisos.

Para 2022, Stabile alerta sobre a importância de analisar o agregado das pesquisas, mas enfatiza que ainda é cedo – pode haver uma virada no cenário, a exemplo do que ocorreu em 2014, com a morte de Eduardo Campos (PSB), e em 2018, com a facada em Bolsonaro. “O jogo ainda nem começou”, avalia.

Além das pesquisas para presidente, há casos de viradas no jogo também em âmbito estadual. Por exemplo, o sucessor de Sérgio Cabral no governo do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), começou a disputa de 2014 com 3% de intenções de voto e a campanha foi bem-sucedida em ampliar a margem e elegê-lo, com mais de 55% dos votos válidos.

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Retrospectiva: Há 4 anos ex-desembargador Homero Sabino denunciava os excessos do juiz Sérgio Moro e dos procuradores da Lava Jato

Numa entrevista em 31 de dezembro de 2016, os 88 anos, o ex-desembargador Homero Sabino advertia contra os excessos da “República de Curitiba”. Sobre o ex-juiz Sérgio Moro dizia: “Juiz não é algoz”. Em relação ao ativismo dos procuradores da Lava Jato alertava que “a Lava Jato tem que chegar ao fim, senão via ditadura do Judiciário”.

Passados quatro anos, as falas de Homero Sabino soam como proféticas. Sentenças proferidas no STF (Superior Tribunal de Justiça) e no STF (Supremo Tribunal Federal) apontaram falhas gravíssimas na condução da Operação Lava Jato, lançando sob suspeição o ex-juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa.

Em novembro, Moro, que foi ministro da Justiça do presidente Jair Bolsonaro assumiu consultoria em empresa norte-americana que presta serviços à Odebrecht, empresa que, como juiz, Moro negociou acordo de delação premiada. Deltan foi advertido pelo TCU (Tribunal de Contas da União) por se apropriar indevidamente de R$ 2,3 bilhões de recursos da Petrobrás que os procuradores de Curitiba pretendiam usar ao bel prazer, numa ONG (Organização Não-Governamental) por eles criada para gerir dinheiro recuperado de supostos esquemas de corrupção.

Vale a pena ler novamente a entrevista com o decano do Judiciário goiano, principalmente após a decisão do STF que ressalta que perícia feita pela Polícia Federal atesta integridade de mensagens hackeadas de procuradores e publicadas pela imprensa (Folha, The Intercept, BandNews) no escândalo que foi denominado “Vaza Jato” e mostrou graves desvios éticos e funcionais dos procuradores curitibanos e do ex-juiz Sérgio Moro na condução da Lava Jato.

Confira a entrevista:

“Decano da magistratura em Goiás diz que juiz não é algoz e deve falar somente nos autos, critica excessos cometidos na Lava Jato e avalia que é preciso uma nova Lei de Anistia para pacificar o país”

 

Ex-presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, ex-presidente do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), fundador e ex-presidente da Asmego (Associação dos Magistrados do Estado de Goiás), o desembargador aposentado Homero Sabino tomou posse na noite de ontem como primeiro vice-presidente na diretoria executiva da Asmego. A cerimônia, que empossou na presidência o juiz Wilton Muller Salomão, ocorreu no auditório da entidade.

Decano da magistratura, Homero Sabino continua aos 88 anos um homem de coragem. Em seu discurso, ele defendeu a retomada do garantismo como princípio maior dos operadores do Direito: “Juiz garantista que fui, vi do meu gabinete a perspectiva de fundar a Asmego. Não por coincidência, bem na época em que os direitos também de magistrados eram perseguidos pelos governos ditatoriais, que um dia mancharam a história de nossa Pátria, o Brasil. Como juiz da Quarta Vara Criminal de Goiânia, mandei arquivar nos anos 1960 Inquéritos Policiais Militares abertos que pediam sem fundamento a cassação de direitos políticos de 250 intelectuais, presidentes de associações de classe, professores, jornalistas, juízes, membros do Ministério Público, sindicalistas, estudantes e socialistas. Tive a convicção que era a hora certa de criar esta associação tão respeitada que colaborou recentemente, para eleição, muito importante, do nosso presidente da AMB (Associação dos Magistrados do Brasil), o dr. Jaime de Oliveira, aqui presente. Muito obrigado presidente Jaime, por confiar à Asmego cargos estratégicos na AMB, que hoje são ocupados por colegas nossos, associados a Asmego. Neste período não posso deixar de mencionar que em editorial de nosso jornal, “Novos Tempos, Novos Rumos para a AMB”, reflete.

Garantismo

Numa entrevista exclusiva ao Diário da Manhã, o ex-desembargador retomou temas que foram por ele abordados em entrevista histórica publicada neste mesmo DM no dia 31 de dezembro de 2016, onde alertava: “Lava Jato tem que chegar ao fim, senão vira ditadura do Judiciário“. Um ano e um mês depois ele reforça este mesmo entendimento.  “A ditadura do Judiciário é pior que a ditadura militar. Está nas mãos do Judiciário a maior parte da responsabilidade para voltar o país a ter mais esperanças no fim desta crise terrível. Se o Judiciário errar, aí não sei o que será do futuro do país. Este é o meu pensamento”, assevera. Para ele, o direito no Brasil não se resume apenas as decisões tomadas por determinados juízes de Curitiba, Rio de Janeiro e Brasília.

Com a experiência de quem peitou a ditadura militar num de seus piores momentos, Homero Sabino enfatiza que é preciso que seja retomado o comedimento e a irrestrita observância à Constituição na aplicação do Direito. Em seu discurso, ele advertiu: “Não há que se discutir se a lei determina sanções para aqueles que transgridem, poderosos ou não, agentes políticos ou não, influentes ou não, opinião pública ou não. A lei é igual pra todos, e da nossa parte, senhores, o texto constitucional e tudo que dele deságua, será rigorosamente observado”.

 

Redes sociais

No entendimento de Homero Sabino, “os juízes não podem dar a sentença como se fosse vingança, mas sim uma decisão serena”. Ele se diz preocupado com o ativismo de alguns operadores do Direito, que a seu ver “parece que não estão condenando por causa das provas, e sim pela raiva destilada nas redes sociais que são perigosas. Você não pode pregar e aceitar tudo aquilo que está ali. Porque ali (nas redes) está misturado nazistas e muita gente que propõe volta da ditadura, tudo isto é muito perigoso”, reflete.

Questionado pelo repórter, porque aos 88 anos ele continua fiel aos princípios do início de sua carreira, o ex-desembargador disse: “Continuo na luta contra aqueles que pregam nova ditadura militar. Isto é um absurdo! A gente (e principalmente, vocês jornalistas) têm que ter cuidado. Uma coisa é condenar o Lula, mas eu, por exemplo, tiro do meu celular tudo aquilo que de certa forma degrada um homem que pode ter errado. Vamos condená-lo por isso,  mas não vamos ser algozes. Juízes são julgadores e não algozes”, ensina.

Lava Jato

Crítico da operação Lava Jato, Homero Sabino acha que o combate a corrupção é importante, mas, assim como alertou na entrevista ao DM, um ano antes, volta a advertir para excessos que estão sendo cometidos. Ele discorda das condenações tendo por base as delações premiadas, alerta para ativismo de setores do Ministério Público, que a seu ver, acabaram com a persecução penal e com a prescrição.

“Eu continuo contra, como disse na minha entrevista (em 2016) os excessos da Lava Jato, contra a delação premiada. E sou contra. O Ministério Público hoje é o Quarto Poder. A ação penal hoje está com ele na delação premiada que o juiz não pode interferir. Isto é um absurdo!  Como foi dito na matéria que este jornal fez em dezembro, a delação premiada existiu na revolução. Eles obrigavam (a delação) sob tortura. Eles prendiam já para buscar provas para processar aqueles que eram contra a revolução, como os jornalistas que não se rendiam e tudo mais. Em 1964, como você escreveu naquela matéria feita em dezembro,  eu arquivei o processo contra 250 pessoas que foi feito apenas com base em delações”, ressalta.

O ex-presidente do TJ-GO salienta que nos termos das condenações feitas no âmbito da Lava Jato a persecução penal está acabada. “Estão aproveitando e encurtam ela, e vão direto aquele que foi condenado a 30 anos, e que vai fazer uma delação. Pode até ter um fundo de verdade e uma parte verdadeira, mas será que é desse jeito que uma Justiça funciona? Só com três juízes famosos no país. Será que só estes três resolvem o problema do Brasil?”, questiona. “A prescrição, no meu modo de entender, também tem que ser respeitada”, arremata.

 

Presunção de inocência

Para Homero Sabino, o juiz garantista, com todo cuidado e com toda seriedade,  deve garantir os direitos do processado, dando-lhe amplo campo para a sua defesa. “O juiz é preparado para isto, para não haver excesso, para não haver prova falsa, para não desmoralizar a pessoa antes de ser julgada ou condenada”, ensina. Sabino diz que é à favor da responsabilização direta do promotor e até do juiz se ele não estuda o processo e conscientemente age dolosamente na sua sentença.

Anistia

Refletindo sobre a crise política e institucional que hoje assola o país, o ex-desembargador relembra os pactos sociais que levaram ao fim da ditadura militar. Ele salienta que os Três Poderes devem se mirar na Anistia, que foi aprovada em 1979, que incluiu perseguidos e perseguidores, pacificando o país e abrindo caminho para a volta da democracia e do Estado de Direito. Sua avaliação é que deve ser feita uma nova concertação nacional, para que as instituições possam retomar o equilíbrio e a independência entre os Três Poderes.

Do alto de sua vivência de mais de seis décadas como operador do Direito e como advogado, Homero Sabino se diz preocupado com a interferência de setores do MP e do judiciário ligados a Lava Jato na nomeação de ministros.”Eu acho que o presidente Temer tem o direito de errar, e o juiz não pode corrigir ele. Ele foi eleito para fazer estas nomeações. Agora, tomou posse, aí sim  o Ministério Público, se necessário for, entra com ação para afastar este ministro”, conclui.

 

O juiz que peitou a ditadura e o dedurismo

Em 1965, nos primeiros meses do golpe militar, o juiz Homero Sabino proferiu em sua sentença que “não é crime ser comunista”, livrando da cadeia políticos e intelectuais goianos acusados por dedo-duros

 

Nos anos de chumbo, a ditadura militar baixou cinco decretos, os chamados Atos Institucionais. Eles foram feitos para calar a voz, perseguir e prender opositores do regime. O primeiro deles foi o AI-1, e Goiás um dos primeiros estados da federação onde foi aplicado.  O AI-1 previa prisão, cassação dos direitos políticos, exoneração de servidores públicos e outras barbaridades, mas para ser alvo deste ato, a vítima primeiro devia ser acusada através de um delito “anti-revolucionário”, então era montado um IPM (Inquérito Policial Militar). Os dedo-duros da época, tal qual os delatores da Lava Jato de hoje, apontavam o dedo na direção de um desafeto, e uma simples acusação de que fulano era comunista, socialista, subversivo ou “falou mal da revolução(?)” bastava para por o elemento na cadeia.  Assim como na Lava Jato, onde basta ser acusado de petista para ir para cadeia, durante a ditadura, bastava ser chamado de comunista para ver o sol nascer quadrado.

Em Goiás um juiz ousou falar não para a ditadura, rejeitar o dedurismo e escrever na sentença que “ser comunista não é crime”. Seu nome, Homero Sabino de Freitas.

Em 11 de dezembro de 1964 (nove meses após o golpe de 1º de abril), foi aberto um IPM contra Tarzan de Castro (ex-deputado federal e na época secretário do governador Mauro Borges), Erlan de Castro, Octovenil Costa, João Paula de Castro, Antônio José de Moura (jornalista e escritor), James Alen Luz (líder estudantil e depois guerrilheiro), Ataualpa Alves Lima, Sebastião Tavares de Morais, Hugo Brockes (publicitário), João  Batista Zacariotti, Pavel Guko, Simão Luty Kossobudszski, Gabriel Roriz, Rodolfo José da Costa, Cleuler de Barros Loyola e outros 147 indiciados, incursos nos artigos 2º, inciso III, 24 e 25 da Lei 1.902 de 5/01/1953 (Lei de Segurança Nacional). No ofício 83/65, enviado ao juiz Homero Sabino de Freitas, da 4ª Vara Criminal de Goiânia, o promotor militar da 4ª Região Militar informa que o IPM foi aberto logo após a eclosão do “movimento revolucionário” e encerrado em novembro do mesmo ano (1964), onde os indiciados são acusados pelo relator do inquérito, no General Riograndino Kruel de serem “comunistas, subversivos, perigosos pregadores da doutrina marxista, ou esquerdistas”.

Na sua sentença, Homero Sabino vai desmistificando o caso. Observa que as imputações aos indiciados “nasceram e cresceram através de testemunhos prestados na maioria dos casos, por adversários ou inimigos políticos dos mesmos indiciados”.

E aqui vale uma contextualização: nos dia de hoje, os procuradores e o juiz responsáveis pela Operação Lava Jato dão mais valor à palavra dos delatores – notórios ladrões do dinheiro público -,do que à presunção de inocência dos acusados. É necessária esta observação para lembrar que quando este IPM chega as mãos do juiz Homero Sabino, o país estava vivendo o auge do dedurismo, da delação, uma vez que muitos oportunistas queriam “de dar bem” com o novo regime, eliminando adversários políticos do caminho.

E na sequência da sentença, mais uma demonstração de equilíbrio do magistrado:

“No mais, vai-se encontrar, como provas indiciárias, notícias sobre a apreensão de livros, jornais, panfletos e revistas de caráter comunista em  poder de certos e determinados indiciados. Tais apreensões, porém, foram feitas nas residências,ora em escritórios profissionais, e que, por si só, muito embora se reconheça o Carter subversivo dos mesmos objetos apreendidos, não basta para caracterizar crime previsto na Lei de Segurança Nacional”.

Ora, no Brasil de hoje, basta a revista Veja, a Rede Globo, o Estadão ou a Folha veicularem matéria onde alguém acusa sem provas um político ou um empresário de estar envolvido em uma suposta maracutaia para o infeliz apodrecer nas masmorras de Curitiba. Vale lembrar o voto da ministra Rosa Weber, no  julgamento da Ação Penal 470 (Mensalão), onde diz textualmente: “Não tenho provas para condenar José Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”. Esta peça de acusação foi escrita pelo juiz Sérgio Moro, que na ocasião auxiliava a ministra.

Ao invés de seguir o caminho fácil de condenar os “subversivos”, o juiz Homero Sabino preferiu aplicar a Lei, e neste sentido, detalhou em sua sentença que a Lei de Segurança Nacional de então não condenava por crime de opinião(com o AI-5, de 13/12/1968, foi instituída outra LSN, mais dura e implacável com os adversários da ditadura):

“A Lei de Segurança Nacional só define como crime as propagandas:

A – de processos violentos para subversão da ordem política e social;

B – de ódio de raça, de religião ou de classe;

C – de guerra.

E, conforme decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal: “o fato de alguém ter em seu poder boletins e panfletos subversivos não constitui princípio de dexecução de propaganda e não caracteriza crime”.

O que vemos, no decorrer deste processo é um Juiz e uma Justiça garantistas dos direitos do cidadão. Homero Sabino aplica a Lei sempre no princípio das garantias individuais e da presunção da inocência, um conceito que a  espetacularização do Judiciário, promovida pela mídia a partir do julgamento do Mensalão, tem contribuído que juízes garantistas sejam perseguidos, pois estariam na contramão dos juízes justiceiros, que ao invés de aplicar o Direito procuram o aplauso e o reconhecimento através de generosos espaços nos grandes meios de comunicação.

Contrariando o histerismo da época, Homero Sabino questiona: “Ser comunista constitui crime contra a segurança nacional? Comete crime aquele que apoia ou critica alguma forma de governo? É crime apoiar as reformas constitucionais (as reformas de base do presidente João Goulart), o voto do analfabeto? É proibido ou constitue crime viajar para Rússia ou para Cuba?”. O próprio juiz responde: “Nenhum destes fatos citados nos relatórios do IPM constituem crime contra o Estado ou contra a ordem política e social”.

Renegando o dedurismo, Homero Sabino esclarece que para condenar os indiciados: “Não bastam os depoimentos. Não bastam confissões obtidas após a prisão”.

Penso que a leitura desta sentença histórica seria de muita utilidade para o procurador Deltan Dallagnol, o juiz Sérgio Moro e seus subordinados na 13ª Vara Federal de Curitiba, até por que, além da sentença de Sabino, o promotor publico que analisou o caso à época, também não via motivos para condenação, conforme registra o magistrado: “”os representantes do Ministério Público, as fls. 315 a 324 requereram o arquivamento do IPM anexo”.

Reforçando os argumentos de sua sentença, o juiz Homero Sabino mais uma vez salienta que “Para chegar a essas conclusões o IPM recorreu ao DOPS e aos depoimentos tomados, muitas vezes, de inimigos ou adversários políticos dos indiciados. Mas não é crime ser comunista, repetimos. Ninguém pode ser punido por delito de opinião (Min. Orozimbo Nonato). É bom que se diga aqui que a Lei de Segurança do Estado – Lei 1802 de 5 de janeiro de 1953, não pune por opinião, debate, critica e polêmica sobre quaisquer doutrinas ideológicas’.

Finalizando sua setença, onde define pelo arquivamento do processso, , Homero Sabino cita trechos do grande jurista Nelson Hungria, que deveriam ter lidos pelo juiz Sérgio Moro e por Joaquim Barbosa, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, que subverteram a teoria do “domínio do fato”, para acusar sem provas:

“Não há direito penal vagando fora da lei escrita. (…) Sub specie júris, não existe crime “sem lei anterior que o defina. A lei penal é assim, um sistema fechado: ainda que se apresente omissa ou lacunosa, não pode ser suprida pelo arbítrio judicial, ou pela analogia,ou pelos princípios gerais de direito, ou pelo costume. (…) o agente não deve contas à justiça repressiva, por isso mesmo que não ultrapassou a esfera da licitude jurídico-penal”.

Confira abaixo foto dos IPMS:

 

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Política

O Globo: Neto de Figueiredo era sócio de Trump

Matéria do jornal O Globo, assinada por André Miranda em dezembro de 2015 (antes da eleição de Trump e Bolsonaro), já evidenciava o que viria a ser o pensamento conservador, ultraliberal, que tomou conta dos EUA e do Brasil após as vitórias do empresário norte-americano e do ex-capitão

POR ANDRÉ MIRANDA, O Globo

RIO — Foi em 2012, num clube de golfe em West Palm Beach, na Flórida, que o carioca Paulo Figueiredo Filho conheceu seu mais ilustre sócio. Figueiredo almoçava com Ivanka Trump, a filha do magnata republicano Donald Trump, candidato às eleições presidenciais americanas, famoso por seu topete escorrido para o lado e pelas posições políticas radicais de direita. Trump chegou ao clube de helicóptero e foi apresentado pela filha a Figueiredo de um jeito bem direto: “O avô do Paulo foi presidente do Brasil, e ele também é bem conservador”.

Como o sobrenome sugere, Paulo Figueiredo Filho é neto de João Figueiredo (1918-1999), o último presidente do regime militar brasileiro. E, como avisou Ivanka, ele é um liberal conservador, com gosto para polêmica tanto quanto Trump. Aos 33 anos, ex-assessor especial do prefeito Eduardo Paes, entre 2009 e 2010, e empresário do mercado imobiliário, Figueiredo é jovial e brincalhão, mas não esconde suas posições políticas e nem economiza nas palavras para expô-las. Em uma hora e meia de entrevista, ele chamou Dilma Rousseff de “jumenta” e Aécio Neves de “bunda-mole”. Disse que os movimentos de minorias “precisam ser massacrados”, que universidades e jornais do mundo foram ocupados pela esquerda por ação da KGB e que a “era dos moderados chegou ao fim”.

— Nunca vi na História os moderados fazerem a diferença. Moderados não fedem nem cheiram. Marina Silva diz que Lula e Fernando Henrique são legais e ruins. Que café é bom com açúcar e com adoçante. Não é assim que se resolvem os problemas do mundo — disse o empresário, em seu escritório na Barra, decorado com um boneco em miniatura de Trump.

O empresário Paulo Figueiredo: ‘moderados não fedem nem cheiram’ – Fernando Lemos / Agência O Globo

CRÍTICAS AOS JORNAIS

Nos últimos anos, Figueiredo ganhou exposição pelos negócios com Trump. Depois do encontro na Flórida, eles se tornaram sócios no Trump Hotel Rio, que será inaugurado em 30 de março, numa área de três mil metros quadrados, na Praia da Barra. Além do mais luxuoso do Brasil, será um dos mais caros: para as Olimpíadas, todos os 170 quartos do Trump Hotel já estão reservados, e a suíte presidencial será ocupada por um empresário chinês que pagou US$ 1 milhão por 22 dias.

— Eu acho que o Brasil vai continuar em depressão profunda no ano que vem, mas o segredo de uma crise é você explorar as oportunidades. No setor hoteleiro, a alta do dólar é benéfica. Cerca de 60% dos meus hóspedes serão estrangeiros, dispostos a pagar uma diária de US$ 400, US$ 500, no mínimo — diz Figueiredo. — O turismo no Brasil é mal explorado. Joaquim Levy deveria parar de querer aumentar impostos e sugerir um plano para fomentar o Brasil como indústria hoteleira. Era só liberar o visto para os americanos. Se tivesse um pedido para a presidente Dilma, eu falaria assim: “Sua jumenta, libera o visto para os americanos”.

Com o anúncio formal da candidatura de Trump à presidência americana, em junho, a fama de Figueiredo aumentou e, em agosto, ele foi perfilado pelo “New York Times”. O jornal tentou opor o sócio brasileiro aos comentários de Trump contra a intensa imigração latina nos EUA. Mas ele não só o defendeu, como compartilha de muitas de suas ideias. Seus posts no Facebook — onde condena o aborto, defende a liberação da posse de armas e chama as feministas de “feminazis” — são controversos, mas chegam a ganhar mais de mil curtidas. Recentemente, ele escreveu que muita gente gosta de seu discurso, mas não curtem para não entrar em polêmica. E sentenciou: “Só penso uma coisa: seu bundão!”

— Aquele jornalista do “New York Times” não passa mais da porta do meu escritório. Ele construiu uma reportagem distorcida. O “New York Times” é um jornal muito ruim, de extrema esquerda — reclamou Figueiredo, que mesmo assim emoldurou a página do jornal americano, ao lado de um quadro da capa da revista “Rolling Stone” com a foto de Trump. — Eu guardo as matérias ruins também. Aceito que o jornalista fale o que quiser, desde que seja correto. Mas todos os jornais têm uma tendência de esquerda muito forte. No Brasil mesmo, não há um jornal de direita. O GLOBO é de esquerda.

Figueiredo estudou comunicação, economia e filosofia. Ele tem uma filha de seis meses nascida nos EUA, é casado há sete e se declara protestante. Nas últimas eleições, votou em Aécio Neves, sem convicção. Na próxima, espera votar em Paes.

— Não achava o Aécio um bom candidato. Ele é horroroso, frouxo, bunda-mole, entregou o Brasil na mão do PT. Agora está desaparecido — diz.

Sobre os atentados em Paris, Figueiredo escreveu na internet: “Pobres civis franceses, desarmados pelos governos de esquerda. Apavorados com terroristas armados nas ruas, o máximo que podem atirar-lhes é uma baguete ou um pedaço de queijo brie”.

DEFESA DO AVÔ GENERAL

Por seus petardos, já foi ameaçado até de morte pelo que chama de “militantes de ambiente virtual”.

— Esses movimentos feministas, gayzistas, de consciência negra, sei lá qual é o nome politicamente correto… São fracos, dão impressão de que são fortes porque são organizados. Esses caras precisam ser massacrados, prestam um desserviço ao Brasil.

Para as críticas a seu avô, último presidente militar do país, tem na ponta da língua a defesa ferrenha.

— Não tem mais homem igual a meu avô. Ele assumiu o governo com o discurso de fazer do Brasil uma democracia plena — afirma, criticando a ideia da volta da ditadura. — A ditadura é um modelo que não me agrada. Mas no Brasil era uma situação de guerra.

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Marx diria: STF serve às elites, estúpido!clique aqui

Além de filósofo, economista e “pai do comunismo”, Karl Marx batia um bolão como jornalista. No próximo 25 de outubro completa-se 151 anos de uma das análises mais contundentes sobre a Guerra da Secessão. O texto foi escrito por Marx para o Die Presse, um diário austríaco burguês de tendência liberal, e mostra como a Corte Suprema dos Estados Unidos se tornou o último bastião das elites escravistas do Sul contra os brancos livres do Norte.

As elites sulistas se valiam de seu domínio sobre o Congresso Norte-Americano para manter e ampliar o regime escravagista. Esse poder, no entanto, erodia-se devido ao crescimento acelerado da população dos estados do Norte e Nordeste, não escravistas. Como a representação na Câmara dos Representantes é ligada à população dos estados, e as populações dos estados livres cresciam acima daquela dos estados escravistas, as elites escravistas perdiam gradativamente o controle da Câmara e dependiam cada vez mais do Senado, onde cada estado, independente da população, tinha dois representantes.

Ocorre que os senhores de escravos também estavam perdendo o controle do Senado e para manter o status quo se valeram da JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA. Notou aí semelhanças com as elites do Brasil? Sim, as elites norte-americanas recorreram à Corte Suprema dos EUA para garantir seus privilégios, e foram os Juízes Supremos, que segundo Marx, deram veredicto pela escravidão:

  “Ela (Corte Suprema) decidiu, em 1857, no notório caso Dred Scott, que todo cidadão americano possui o direito de levar consigo para qualquer território qualquer propriedade reconhecida pela Constituição. Consequentemente, com base na Constituição, os escravos poderiam ser forçados pelos seus donos a trabalhar nos territórios. E assim todo senhor de escravos estaria individualmente habilitado a introduzir a escravatura em territórios até agora livres conta a vontade da maioria dos colonos. O direito de eliminar a escravidão foi tirado das legislaturas territoriais e o dever de proteger os pioneiros do sistema escravagista foi imposto ao Congresso e ao governo da União (pela Corte Suprema)”.

Luta de classes

No Brasil, desde a eleição do presidente Luis Inácio Lula da Silva (PT), as elites conservadoras, que se valeram do Golpe Militar de 1964 para chegar ao poder, têm perdido gradativamente espaço na Câmara Federal e no Senado. O DEM (ex-PFL, ex-PDS, ex-Arena), desmilinguiu-se. No período(1995-2002) de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso(PSDB) o partido chegou a ter 105 deputados federais e 17 senadores na legislatura de 1999. Os eleitos em 2010 foram 4 senadores e 43 deputados, número que reduziu-se a 28, pela migração para outras siglas como o PSD.

Em 2004 o PFL tinha 6.460 vereadores. Em 2012 o DEM reduziu-se a 3.271, ou seja 3.189 vereadores a menos! Em 1996, o PFL elegeu 934 prefeitos, saltou a 1.028 no ano 2000 e em 2012, o DEM elegeu somente 271, ou seja 757 prefeitos a menos!

Até o segundo mandato do presidente Lula, o equilíbrio de forças no Senado era desfavorável ao petista. Com a eleição de sua sucessora, a aliança trabalhista formada por PT-PMDB-PSB-PC do B-PDT e outros partidos, passou a ter domínio no Congresso Nacional.

A presidenta Dilma Roussef assumiu com uma bancada de 311 votos(de 513) na Câmara Federal e de 50(de 81) no Senado. Assim como Karl Marx testemunhou a JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA via Corte Suprema nos EUA –  numa reação conservadora à perda de comando no Legislativo –  o Brasil assiste movimento similar, no STF que se expressa com mais vigor no julgamento da Ação 470, o dito, “Julgamento do Mensalão”.

Exagero? Não.

O que justifica que no julgamento do publicitário Duda Mendonça os ministros do Supremo Tribunal Federal tenham considerado lícito o pagamento de seus serviços na campanha de 2002, com recursos oriundos do Banco Rural, mas em relação aos empréstimos feitos no mesmo banco, para pagamento de despesas de campanha no PR, de Waldemar Costa Neto, no PP, de Pedro Henry, ou pelo PT de Delúbio Soares e José Genoíno, o mesmo dinheiro do Banco Rural transformou-se em “corrupção passiva” e lavagem de dinheiro?

Não houve, nos dois casos, pagamento de despesas de campanha?

Por que apesar da ausência completa de provas no relatório da Procuradoria Geral da República, os chamados “réus do núcleo político” foram condenados com base no “Fato Motivador”, no entanto, apesar do esculacho do ministro Joaquim Barbosa contra o procurador Roberto Gurgel, pela PGR não ter produzido provas contra Duda Mendonça, o empresário não foi enquadrado no mesmo “Fato Motivador”?

O Fato Motivador só se aplica a Puta, Preto, Pobre e Petista, como diria o ator José de Abreu?     Por que o caixa dois do PSDB, o chamado “Mensalão Tucano”, efetivado na tentativa de reeleição do governador Eduardo Azeredo em 1998, teve seu processo desmembrado para julgamento em 1ª e 2ª instâncias, enquanto o “mensalão do PT” teve direito a apenas uma instância de julgamento?     Por que o ministro relator, que colheu as provas na fase de inquérito, também participa do julgamento, tal e qual nos Tribunais da Inquisição?

As respostas estão novamente na análise cento-cinqüentenária de Karl Max: as elites, quando perdem o poder popular, recorrem aos últimos nacos de poder que controlam: seus pares no judiciário e às armas.

Em 1860 foram à guerra contra Lincoln. Em 1964, ao golpe contra Jango. E em 2012, ao STF contra Lula e o PT.     Nos EUA, os aristocratas do Sul, no Brasil, os Barões da Mídia a comandar a Corte Suprema.

Ah, diriam alguns, mas o relator da Ação 470, Joaquim Barbosa é um filho do povo, um ministro cujo pai era pedreiro, que veio do interior do país, de Paracatu-MG. Sim, de lar humilde, mas, ao que tudo indica, sem compromissos com sua classe de origem, pois somente isto justifica sua frase: “Presidente, o Supremo Tribunal Federal não tem que dar satisfação a ninguém!”.

Se o Supremo como Poder da República, segundo o ministro Barbosa, não deve satisfações ao povo, é porque do povo está divorciado. Se a Corte Suprema Brasileira não está casada com o povo que banca neste ano de 2012, com impostos, os R$ 614,073 milhões aprovados na LDO para manutenção do STF, cumpre a este povo perguntar: a quem serve o STF?   Marx responderia: “Serve às elites, estúpido”!

Publicado também no site Brasil247 e no blog Terror do Nordeste em 18/10/2012